segunda-feira, 29 de junho de 2009

Abandono de Mercadorias - Penalidades

(Autor: Paulo Werneck, Auditor Fiscal da 7ª Região Fiscal, professor universitário, escritor, engenheiro eletricista, mestrado em Administração)

Se uma mercadoria permanece mais tempo que o devido num local alfandegado, sem que seja iniciado o despacho aduaneiro de importação, estará sujeita à aplicação da pena de perdimento por abandono, como medida profilática. Caso isso não ocorresse, nenhum porto brasileiro estaria operacional hoje em dia, atulhado que estaria de mercadorias abandonadas desde a sua fundação...

As demais situações que ensejam também a aplicação da pena de perdimento são consideradas dano ao erário e a aplicação da penalidade não pode ser relevada, o que não ocorre no caso de abandono.

Mesmo assim, há que se ter em mente que diversas situações distintas, com diferentes conseqüências, podem ocorrer no caso de abandono.

Até o momento em que transcorre o prazo permitido para a armazenagem da mercadoria, o importador pode iniciar o processo de desembaraço da mercadoria. A data de ocorrência do fato gerador será a data do registro da Declaração de Importação.

Esgotado o prazo, mas não notificado, pela Receita Federal, do início do processo de perdimento, o importador ainda poderá iniciar o processo de desembaraço da mercadoria, só que deverá considerar como sendo a data do fato gerador a data que configure o abandono da mercadoria pelo decurso do prazo de permanência em recinto alfandegado, ou seja, os tributos serão calculados como se a Declaração de Importação tivesse sido registrada naquela data, e o importador deverá pagar também a multa e os juros de mora devidos daquela data até a do efetivo registro da declaração (Regulamento Aduaneiro, art. 575). (nova redação pelo Decreto nº 6.759/2009, artigo 643 do R.A.)

Se o importador já foi notificado, mas a penalidade ainda não foi aplicada, este poderá solicitar a relevação da pena de perdimento. Deferido o pedido, formulará a
Declaração de Importação, da mesma forma que se não houvesse sido notificado, só que agravada pela multa de um por cento do valor aduaneiro da mercadoria (Regulamento Aduaneiro, arts 575, 637 e 655). (nova redação pelo Decreto nº 6.759/2009, artigos 643, 712 e 737 do R.A.)

Se a penalidade já foi aplicada, mas a mercadoria ainda não foi destinada, ou seja, ainda não tenha ocorrido a assinatura do correspondente Ato Declaratório ou Termo de Destruição poderá ser convertida em multa equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria, salvo no caso de mercadoria não conceituada como bagagem, trazida pelo viajante, caso em que a multa equivalerá ao valor dos tributos devidos (Instrução Normativa 69/1999, art. 4º).

Se, finalmente, a penalidade foi aplicada e a mercadoria foi destinada, nada resta a fazer. Como diria a malandragem, perdeu...

Fundamentação Legal:

- Decreto nº 6.759, de 05 de fevereiro de 2009;
- Instrução Normativa nº 69, de 16 de junho de 1999.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Gafes sem fronteira

Perdeu um negócio só porque se recusou a comer uma cabeça de peixe? Fique calmo: você não é o único que está se acostumando com as regras da etiqueta global

Texto: José Francisco Botelho

"Gafe: ação ou palavra impensada, indiscreta e desastrada.” Ler a definição do dicionário pode não ser o suficiente para aprender a evitá-la – mas certamente ajuda a entender o que provoca essas situações embaraçosas e, muitas vezes, comprometedoras. No dia-a-dia, elas são motivo de riso. Nos negócios, porém, esses deslizes não têm graça nenhuma – especialmente para quem faz negócios internacionais, um campo minado para executivos inexperientes ou desatentos.
Até época bem recente, os empresários brasileiros não precisavam esquentar a cabeça com os perigos de cometer uma gafe “internacional”. Embora tenha dado seus primeiros passos no mercado externo já na época do pau-brasil, o país só escancarou as portas para o mundo a partir do ano 2000. “Foi no início deste século que as empresas brasileiras passaram a investir pesado nas vendas externas e na internacionalização”, explica José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB). Ao entrar na arena global, os brasileiros logo perceberam que a cultura da informalidade, tão popular em sua terra natal, nem sempre funciona lá fora. “Nossos negociadores ainda têm pouca experiência, mas estão evoluindo rápido”, pondera Castro. Um tropeço aqui e outro ali, portanto, é mais do que normal. Mas sempre é possível evitar – e um caminho natural para isso é aprender com quem já passou por algumas situações embaraçosas, como as relatadas a seguir.

Água morna e tinta preta
Lição nº 1 para evitar gafes internacionais: é preciso fazer o dever de casa. Antes de ir a uma reunião, não custa nada pesquisar um pouquinho sobre o interlocutor e seu background cultural. Assim, pode-se escapar de situações como a vivida por Wilson Andersen Ballão, presidente da unidade curitibana da Câmara de Comércio e Indústria Brasil–Alemanha. “Estávamos esperando três empresários da Malásia para discutir uma joint venture. Era uma transação que envolvia milhões de dólares”, conta ele. Quando os malaios apareceram, os brasileiros, como de hábito, ofereceram cafezinho. Mas os recém-chegados responderam, em inglês, que preferiam beber “água morna”. Os brasileiros ficaram um tanto confusos. Sem saber direito o que os estrangeiros queriam, eles trocaram o café por três xícaras de chá. De novo, os asiáticos recusaram. E, dessa vez, foram mais explícitos: na região de onde vinham, era mesmo costume beber água morna – e pura.
E a confusão não acabou aí. Na hora de assinar o contrato, os brasileiros usaram canetas de tinta azul. Os visitantes foram categóricos: o documento teria de ser refeito. Por quê? Muito simples: na Malásia, acordos importantes só podem ser assinados com tinta preta. “Nossos deslizes naquele dia poderiam ter enterrado o acordo. A sorte é que os malaios estavam tão interessados em fechar o negócio quanto nós”, lembra o empresário. A transação acabou sobrevivendo às gafes – e a companhia malaia, cujo nome Ballão prefere não revelar, abriu sua fábrica no país.

Cartões e cabeças de peixe
Desde que abriu suas portas ao capital estrangeiro, no final dos anos 80, a economia chinesa cresceu mais do que qualquer outra no planeta. Para se ter uma idéia do ritmo alucinante dessa expansão, basta dizer que metade do concreto utilizado no mundo em 2003 foi parar em arranha-céus e condomínios chineses. Hoje, o país é o segundo maior importador de produtos fabricados no Brasil, perdendo apenas para os Estados Unidos. Por isso, os empresários brasileiros estão cada vez mais interessados em truques e dicas para agradar a negociadores chineses. Mas domar esse dragão não é tarefa fácil: poucas culturas no mundo são tão obcecadas com o cumprimento de protocolos. A rigorosa e temida etiqueta chinesa remonta a mais de 3 mil anos e abrange regras que, aos olhos de outros povos, podem parecer absurdas.
Os chineses dão muita atenção a pequenos detalhes. E, para fazer sucesso entre eles, é preciso respeitar esses costumes, por minúsculos que pareçam”, explica Valdir Vianna, gerente de tecnologia da informação da norte-americana Blount Industrial, que tem filiais na China. Vianna cita um exemplo bem prático da importância que os chineses dão às minúcias: entre eles, é costume entregar cartões comerciais com as duas mãos. Esse gesto é visto como uma forma de denotar confiança e expressar credibilidade. Se um executivo estrangeiro entregar seu cartão com uma única mão – ou, pior ainda, largá-lo em cima da mesa –, estará correndo o risco de transformar o encontro em um fiasco.
Outro detalhe fundamental é o comportamento à mesa. Banquetes comerciais são levados muito a sério e a distribuição de assentos para anfitriões e visitantes segue uma hierarquia bem definida. Quem ocupar a cadeira errada pode ser polidamente convidado a se retirar. Além disso, os chineses têm o costume de oferecer cabeças de peixe para os convidados mais importantes – e recusar essa desagradável honraria é uma ofensa gravíssima. “O pior de tudo é que, na maior parte das vezes, os chineses não demonstram estar irritados com os deslizes dos convidados”, conta Vianna. “Continuam sorrindo e conversando amavelmente. Mas, no fundo, já estão preparando o troco contra o autor da gafe. Deixarão de responder e-mails, não atenderão telefonemas, enviarão subalternos para os próximos encontros e cancelarão acordos sem maiores explicações.” Na China, até a vingança é uma arte sutil.

Na dúvida, não sambe
No país do “jeitinho”, corre a lenda de que qualquer problema pode ser resolvido com uma risada amigável e um bom gracejo. Lá fora, no entanto, essa estratégia nem sempre funciona: às vezes, a melhor solução para escapar de situações embaraçosas é ficar de boca fechada e sair de fininho. Foi exatamente o que fez Jorge Kusser, diretor da Go4!, ao se ver em apuros em um seminário na Suíça. Durante a abertura do evento, ele passou boa parte do tempo conversando com um amigo, sem prestar atenção no que o palestrante dizia. Subitamente, escutou seu próprio nome. Acreditando que fora chamado para um discurso de improviso, Kusser levantou e foi direto ao palco. Chegando lá, descobriu que o líder da reunião estava apenas lhe dando os cumprimentos por seu aniversário – que, por sinal, era naquela data. Por um instante, Kusser ficou sem saber como escapar daquele aperto. “Se estivesse no Brasil, poderia fazer uma gracinha e transformar o embaraço em divertimento. Mas eu estava na Suíça, um país muito mais formal do que o nosso. Naquela situação, o ‘jeitinho’ brasileiro só teria piorado as coisas”, diz ele. “Portanto, preferi ficar quieto. Simplesmente agradeci o cumprimento e voltei para o meu lugar. Se me comportasse assim no Brasil, poderia ser considerado um antipático.” Ou seja: presença de espírito é sempre importante, mas nunca suficiente. Quem tentar resolver tudo na base do samba pode acabar confundindo descontração com descaso.

Informação demais não cheira bem
Na era da globalização, trabalhar em multinacionais é uma alternativa cada vez mais atraente para jovens (e ambiciosos) executivos. Mas alcançar posto de destaque em uma companhia desse gênero pode ser uma tarefa traiçoeira. Entrevistas de emprego nunca são fáceis – e a coisa complica ainda mais quando o futuro patrão é um estrangeiro. O headhunter Bernt Entschev, que já acompanhou diversas entrevistas para cargos executivos em multinacionais, tem uma lista de pequenos desastres que podem arruinar as chances de qualquer candidato. Quase sempre, a culpa é do excesso de informalidade e da falta de discrição. Falar demais, por exemplo, é um erro que geralmente tem conseqüências fatais. “Certa vez, durante uma entrevista, o candidato começou a tagarelar sobre a última empresa em que havia trabalhado”, conta Entschev. “Para impressionar o futuro empregador – um alemão que vivia no Brasil, há alguns anos –, ele passou informações confidenciais e chegou a falar mal de seus antigos chefes.” O entrevistador, claro, ficou pasmo. E riscou o nome do candidato assim que o encontro acabou.

(fonte: Gafes sem fronteira - Amanha ago. CE 14/09/2005)